A Psicologia brasileira foi surpreendida por uma decisão liminar da Justiça Federal (seção judiciária do Distrito Federal) no dia 15 de setembro de 2017, que, apesar de manter a íntegra do texto da Resolução CFP 01/99, oferece interpretação ao artigo terceiro do documento, a saber, sobre o sentido do veto à adoção de “ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados”. A interpretação tornada oficial pelo juiz federal Waldemar Cláudio de Carvalho é a de que o conselho de classe profissional “não a interprete (a norma) de modo a impedir os psicólogos de promoverem estudos ou atendimento profissional, de forma reservada, pertinente à (re)orientação sexual, garantindo-lhes, assim, a plena liberdade científica sobre a matéria, sem qualquer censura, ou licença prévia por parte do CFP”. A decisão liminar responde à ação pública promovida por um grupo de profissionais de Psicologia, que alegam que a normativa da categoria de classe impõe censura a profissionais que desejam realizar pesquisas sobre as práticas homoeróticas, limitando a liberdade científica e lesando o patrimônio cultural e científico do país.
O Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília, instância de referência em pesquisa, produção de conhecimento e formação de profissionais de Psicologia no Brasil, entende que tal decisão liminar invisibiliza o sentido originário da resolução, a saber, a necessidade histórica de posicionamento da Psicologia no reconhecimento das subjetividades homossexuais e recusa ética do histórico de abuso e violações de direitos praticados pela própria Psicologia ao ter produzido e desenvolvido terapias de reversão da orientação sexual na lógica das terapias de aversão. Tais práticas foram revisadas eticamente e historicamente negadas pela ciência psicológica e pela categoria de classe como medidas violadoras de direitos e entendidas como técnicas adotadas em um tempo histórico de manicomialização na assistência à saúde mental das pessoas.
O Instituto de Psicologia manifesta sua discordância sobre a pertinência da realização de estudos sobre terapias de reversão, pois historicamente já dispomos de evidências sobre a sua ineficácia e contribuição para o agravamento do sofrimento psíquico de pessoas homossexuais, como consta no documento de referência produzido pela American Psychological Association em 2009, denominado Appropriate therapeutic Responses to Sexual Orientation. Tal força tarefa compilou estudos científicos com base empírica para subsidiar a não recomendação de terapias de reversão da orientação sexual. Como instância representativa da produção científica e acadêmica de conhecimento em Psicologia no Brasil, o Instituto de Psicologia da UnB reitera o compromisso com a produção de conhecimento não patologizador sobre as homossexualidades, sobre a recusa a tratamentos psicológicos que desconsiderem a complexidade das representações sociais estigmatizadoras que recaem sobre sujeitos homossexuais e rejeita a decisão liminar apresentada pela Justiça Federal.
CONSELHO DO INSTITUTO DE PSICOLOGIA