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NO DIA NACIONAL DE COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO O CRP 01/DF CONVERSA COM TRÊS PROFISSIONAIS ESPECIALISTAS NO ASSUNTO

NO DIA NACIONAL DE COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO O CRP 01/DF CONVERSA COM TRÊS PROFISSIONAIS ESPECIALISTAS NO ASSUNTO



As diferentes perspectivas do trabalho escravo na atualidade

No Brasil, o dia 28 de janeiro é dedicado a um assunto que, em tese, deveria ter sido extinto em 1888, quando a Princesa Isabel assinou a carta de abolição da escravatura. Entretanto, práticas de exploração no trabalho perduram até os dias atuais e, por esse motivo, foi criada uma data para evidenciar a importância de se combater o trabalho escravo. A opinião da necessidade do combater o trabalho escravo é fundamentalmente unânime, mas, assim sendo, por que motivos ainda existem situações de escravização?

Para que você possa comparar a visão de uma psicóloga, estudiosa e atuante na área, com a de um representante do Ministério Público do Trabalho (MPT/DF), que é o órgão que fiscaliza as situações de trabalho escravo no Distrito Federal, o Conselho Regional de Psicologia do DF organizou uma entrevista que expõe diferentes olhares sobre a questão. Para complementar, o órgão de classe também se posicionou a respeito do assunto, por meio da percepção do conselheiro coordenador da Comissão Especial de Psicologia Organizacional e do Trabalho, Vitor Barros.

O psicólogo Vitor é mestre em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações (PSTO/UnB), docente universitário e possui consultório próprio para atendimentos psicoterápicos. Ele escreveu o livro “Adoecimento psíquico no trabalho bancário: da prestação de serviços à (de)pressão por vendas”.

A psicóloga Liliam Deisy Ghizoni é representante da Universidade Federal de Tocantins (UFT) na Comissão Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo (COETRAE/Tocantins). Mestre em Educação (UFSC) e Doutora em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações, atualmente ela leciona na UFT, nos cursos de Administração e Mestrado em Comunicação e Sociedade.

Há 24 anos o Procurador Regional do Trabalho Cristiano Paixão integra o Ministério Público do trabalho. Ele também é membro titular da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (CONAETE) na Procuradoria Regional do Trabalho de Brasília-DF.

Confira os pontos de vista desses três profissionais envolvidos com o tema na entrevista a seguir:

1) Como você caracterizaria o trabalho escravo nos dias atuais?

Cristiano Paixão: O Brasil possui uma das definições mais modernas e abrangentes de trabalho escravo do mundo. As hipóteses de trabalho em condições análogas as de escravo são contempladas no art. 149 do Código Penal, com a redação modificada em 2003: Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto (...). Também incorre quem: cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho; mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.

Liliam Deisy Ghizoni: O trabalho escravo contemporâneo ou trabalho análogo à escravidão não é uma mera infração trabalhista, é um crime contra a dignidade humana. Pois seres humanos são colocados em situação de trabalho forçado, jornada exaustiva, servidão por dívida e em condições degradantes, por outro ser humano, só que este (contratante) detém o poder sobre o outro (trabalhador), que se encontra em situação de vulnerabilidade e acaba cedendo à oferta de trabalho, que pode ser chamada neste caso de aliciamento, pois há sempre um intermediário (chamado de gato) que convence o trabalhador, por meio de falsas promessas, a mudar de cidade ou estado em busca de uma melhor condição de vida. O trabalhador é facilmente enganado, pois a grande maioria vive em estado de penúria e miserabilidade. Há que se destacar que estas migrações não só para o meio rural, em atividades de agricultura e pecuária, mas também para os centros urbanos, onde estes trabalhadores acabam fazendo atividades nas áreas da construção civil, confecções, dentre outros.

Vitor Barros: Percebo que o trabalho escravo atualmente apenas reedita o que se tinha há séculos atrás: uso de mão de obra de pessoas mais carentes e sem instrução, alojando dentro do local de trabalho como forma de “pagamento” pelo trabalho realizado. A diferença é que tem sido utilizado por grandes empresas, como a M. Officer (loja de roupas masculina e feminina). Além disso, é importante notar algumas características do atual momento de uma escravidão dos tempos modernos: o trabalhador tem um contexto de trabalho relativamente ergonômico, recebe salário, vale refeição, porém a carga associada a esse trabalho e o salário não são equilibrados o suficiente para que este trabalhador tenha alguma progressão na vida profissional. Por exemplo: os motoristas de aplicativo trabalham de maneira bastante precária. O carro é do trabalhador que “empresta” para empresa usar. Os gastos com o carro (instrumento de trabalho) são pagos pelo próprio trabalhador. A carga horária é feita pelo próprio trabalhador, sem que haja preocupação com a saúde do mesmo, pois seu foco é fazer corridas até ter algum retorno financeiro. E, além disso, em caso de assalto ou morte enquanto trabalha, o vínculo com o aplicativo não caracteriza que seja uma morte no trabalho. Assim, os familiares do motorista que eventualmente venha a morrer nada recebem como indenização.

2) Em tempos de precarização e mudanças de leis trabalhistas, há uma tendência em relação às atividades laborais que se assemelha à escravidão nos tempos modernos. Como você enxerga esse momento em que os vínculos trabalhistas estão modificados para uma relação mais fluida e mais volátil?

Cristiano Paixão: Esse é, de fato, um quadro muito preocupante. Está em vigor a Lei nº 13.467/2017, a chamada reforma trabalhista, que pretende permitir uma ampla terceirização e diminui a proteção social aos trabalhadores. Alguns empregadores podem interpretar essas novas regras de uma forma equivocada, como se existisse uma liberdade irrestrita de flexibilizar os vínculos que caracterizam um contrato de trabalho. E isso pode conduzir a mais situações de exploração do trabalho humano, o que inclui a sujeição ao trabalho análogo ao de escravo.

Liliam Deisy Ghizoni: Uma excelente pergunta, que me oportuniza falar do estudo feito pela Sarah Fernandes Brito, sob minha orientação no grupo de pesquisa Trabalho e Emancipação. Ela entrevistou quatro categorias de trabalhadores urbanos: costureira, motorista de Uber, atendente de telemarketing, auxiliar de serviços gerais de empresa terceirizada e bancária de banco público. Nosso olhar era justamente para esta “neoescravidão” que se encontra presente na contemporaneidade, sobretudo no meio urbano. Observamos que estes trabalhadores estão submetidos a um desgaste físico e mental, porém passam a naturalizar e ver como uma forma normal de se trabalhar e viver. Nesta neoescravidão observa-se que o trabalhador se autoexplora pela precisão, sobrevivência e também pelo desejo de acumular e consumir, tornando-se senhor e escravo de si mesmo. Neste estudo, isso ficou evidente no caso das bancárias, do motorista da Uber e da auxiliar de serviços gerais. Sendo assim, considero que o pano de fundo desta temática que envolve o trabalho escravo contemporâneo é a vulnerabilidade do trabalhador nos tempos atuais. É importante dizer que não é algo novo no Brasil, pois desde a década de 1980 a literatura já sinalizava, pelo termo “precarizado” (junção do adjetivo \?precário\? e do substantivo \?proletariado\?), ao tratar de trabalhadores que entram e saem de trabalhos cada vez mais desvinculados da sua subjetividade. O que eu vejo então é um cenário com muitos trabalhadores que muitas vezes não encontram sentido nem dentro, nem fora do trabalho, o que abre espaço para as diversas formas de adoecimento advindos do trabalho.

Vitor Barros: O risco é para que se naturalize mais ainda esta flexibilidade de contrato. Ainda, maior desconexão do trabalhador com o resultado coletivo. Ou seja, há uma probabilidade maior de que a qualidade dos serviços prestados e produtos seja menor. No entanto, o pior dos cenários é a quantidade enorme de trabalhadores adoecidos por uma gestão de medo e ameaças, porém sem condições de buscar tratamento para tais doenças. Provavelmente, as estatísticas mostrarão que o número de trabalhadores afastados por acidente de trabalho irá diminuir, mas principalmente porque os vínculos formais de trabalho também decrescerão. Não há nenhum mérito para se comemorar dessa forma estas estatísticas.

3) O que mudou com as novas regras sobre trabalho escravo no Brasil, que geraram tanta polêmica?

Cristiano Paixão: O Governo Federal editou, em 16 de outubro de 2017, a Portaria n, 1.129, que procurou dificultar as operações de combate ao trabalho escravo no Brasil. Ela continha vários artigos que contrariavam o disposto no Código Penal, ao exigir violência ou coação para a configuração do trabalho escravo, além de impor várias dificuldades para a divulgação do cadastro de empregadores que utilizam mão de obra escrava. Houve uma imediata reação de vários setores da sociedade contra essa Portaria, que acabou sendo suspensa por uma liminar deferida pela Min. Rosa Weber, do STF. Em 29 de dezembro último, o Governo Federal, pressionado e percebendo a ilegalidade que havia cometido, revogou a Portaria e regulamentou a matéria com base no Código Penal, o que é o correto.

Liliam Deisy Ghizoni: Penso que estamos vivendo um retrocesso histórico. Há anos se discute esta redução da definição do termo Trabalho Escravo no Brasil, e agora, no governo atual, isto ganhou força e se materializou em diversos documentos oficiais que levou os fiscais do Ministério do Trabalho (personagens centrais para a identificação do Trabalho Escravo) a ficarem de mãos atadas, vendo a realidade e sem poder autuar. É na verdade uma guerra de forças entre oprimidos e opressores. E ai, fica fácil de perceber quem sai perdendo: os próprios trabalhadores vulneráveis. O nosso papel dentro da Universidade tem sido também este, de divulgar o tema Trabalho Escravo, desmistificando a imagem das correntes que prendiam os escravos, pois agora o que acorrenta não são os grilhões de ferro e sim a precisão, a necessidade, a vulnerabilidade, a condição socioeconômica dos sujeitos.

Vitor Barros: Acredito que se fragiliza bastante a fiscalização de tais práticas quando define de maneira frágil o que caracteriza trabalho escravo. Assim, abre precedentes para que aconteçam de maneira mais recorrente, bem como dificulta o acesso da população à verdade sobre a linha de produção do produto que se está consumindo. De certa forma, não coloca a população para exercer também uma reflexão moral e ética sobre como os produtos que consome são feitos.

4) Qual é o cenário atual do trabalho escravo no DF? Para você, o atual sistema de fiscalização é eficiente e suficiente para combatê-lo?

Cristiano Paixão: Nos últimos anos, o MPT recebeu 42 denúncias relativas à existência de condições de trabalho análogas à de escravo. Elas são todas investigadas, com um Procurador que oficia, toma as medidas cabíveis e que pode constatar que a prática foi cessada (o que conduz ao arquivamento do procedimento) ou pode ingressar com uma ação judicial. O MPT recebe denúncias por meio de sua página na internet ou mediante comparecimento do denunciante à sede da instituição. O anonimato é preservado. Além disso, o MPT participa de vários fórums dedicados à erradicação do trabalho escravo, o que permite uma interlocução com parceiros institucionais que podem encaminhar eventuais denúncias. A atuação do MPT é central para o combate ao trabalho escravo, na medida em que se trata de uma maciça violação a direitos humanos, e o Ministério Público tem atribuição constitucional de combater essas práticas. Mas o combate à escravidão contemporânea necessita de uma grande articulação entre órgãos governamentais, judiciais, do MP e da sociedade civil, o que ocorre hoje, especialmente por meio da Conatrae, (Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo), órgão com composição plural, criado após compromisso assumido pelo Brasil perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, no qual o MPT possui assento. No que diz respeito às denúncias que chegam até o MPT, elas são imediatamente distribuídas, por sorteio, a um Procurador do Trabalho, que será o responsável pela investigação do ilícito.

Liliam Deisy Ghizoni: O sistema de fiscalização que o Brasil possui é modelo internacional. Há uma rede de órgãos públicos que atuam especificamente nesta temática: Policia Federal, Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Ministério do Trabalho, dentre outros, além de entidades da sociedade civil, como a Comissão Pastoral da Terra, Ordem dos Advogados do Brasil, Universidades, grupos de pesquisa, movimentos sociais, etc. Mas o que houve em 2017 foi um corte de verbas violento, que não permitiu o trabalho ser feito como deveria. Criou estatísticas falsas sobre o número de trabalhadores escravos no Brasil. Não diminuiu de fato e sim, diminuiu por falta de localização destes casos, pela dificuldade em se fazer as fiscalizações, autuações, etc. Algo que pode ser feito, trazendo para o âmbito da Psicologia, é que os psicólogos e psicólogas, que atuam em CRAS e CREAS principalmente, se engajem com as Comissões Estaduais de Erradicação do Trabalho Escravo, para que juntos possam unir forças e criar políticas de atenção ao trabalhador resgatado, para que ele não retorne a condição de escravo.

Vitor Barros: Não se tem tantas denúncias em relação a trabalho escravo no DF, acredito que muito se deve ao fato de a cidade não ser um polo industrial. O atual sistema é bom para fiscalizar. Porém, toda fiscalização depende de se ter mais agentes fiscalizadores, bem como canais para denúncias de fácil acesso. Campanhas educacionais seriam de ótimo grado para que se fosse abordado este assunto abertamente.

5) Como combater os danos que as situações de exploração laboral causam à saúde mental do indivíduo? Qual o papel da Psicologia nisso tudo?

Liliam Deisy Ghizoni: Um trabalhador resgatado de uma condição análoga à de escravo, seja por estar preso em fazendas distantes sob ameaça, seja dentro da cidade construindo prédios por meio de contratos ilegais, o dano à saúde mental acontece. Entretanto, o trabalhador se vê numa situação de ter que repetir o fato pela situação de vulnerabilidade. Então é importante que nós Psicólogos possamos nos engajar na linha de ação para o combate do Trabalho Escravo, que é composta por três áreas: prevenção, assistência à vítima e repressão ao crime. Esta assistência é geralmente feita por meio dos CRAS e CREAS, mas nem sempre temos equipes engajadas no combate, para que se evite a repetição do caso. É muito comum um trabalhador ser resgatado de uma condição de trabalho escravo mais de uma vez.

Vitor Barros: Os traumas advindos desta situação precária podem perdurar por anos. A Psicologia tem papel fundamental justamente pela sua capacidade de oferecer uma escuta qualificada e especializada para ajudar o trabalhador a lidar com estigma de baixa auto estima, de menos valia e, em muitos casos, com memórias de violência física e moral.

6) A pobreza extrema e a vulnerabilidade social são fatores que perpetuam a situação de escravidão? Quais são as principais causas e contribuições para que haja, até hoje, esse tipo de exploração?

Cristiano Paixão: Sim, a pobreza e a vulnerabilidade são fatores cruciais nesse processo, pois levam o trabalhador a aceitar um posto de trabalho que é degradante e viola sua dignidade. As causas são várias, que vão da falta de proteção do trabalhador até a existência de práticas desumanas de exploração por empregadores que não têm compromisso com os direitos fundamentais mínimos para a vida em sociedade. Há razões históricas também. O Brasil foi um dos últimos países a abolir a escravidão, e essa história de exploração ainda se faz presente em contextos de exploração do trabalho humano, tanto no campo como na cidade.

Liliam Deisy Ghizoni:É exatamente isso: a vulnerabilidade socioeconômica dos trabalhadores. É importante que se tenham ações da sociedade civil, criação e implementação de políticas públicas de órgãos governamentais, para que se busque reverter a situação de pobreza e de vulnerabilidade dos trabalhadores, para que o sujeito não tenha que se submeter a esta condição de escravo nos tempos atuais.

Vitor Barros: São fatores preponderantes sim, pois estamos falando de uma relação de poder bastante hostil que se serve da fragilidade do outro para estabelecer tal dominação. Trabalhadores bem formados, informados e com acesso a canais de denúncia se tornam um empecilho para os que querem perpetuar um regime escravocrata. Outro fator que também influencia é a competitividade do mercado, que exige que a linha de produção seja a mais barata possível para se atingir maior lucro. Para isso, muitas empresas terceirizam, quarteirizam suas linhas de produção. Muitas alegam não saber que há trabalho escravo em sua linha de produção justamente por se valerem de um contrato de terceirização. Ou seja, se eximem da culpa pelo ocorrido. Trata-se de uma esperteza pragmática, mas vazia de ética e moralidade. Será que não são suficientemente zelosos para fiscalizar o rigor e a excelência de como são produzidos seus produtos? Ou preferem não ver por conveniência? Esta última opção tem sido a mais recorrente.

7) A quais consequências o trabalhador explorado está exposto? O que ele precisa fazer para sair da situação de escravidão em que se encontra?

Cristiano Paixão: A submissão ao trabalho em condições análogas à de escravo é uma das mais graves violações de direitos humanos que pode existir. A escravidão denota a exploração aguda do trabalho humano, com a perda da dignidade do trabalhador, que é algo muito sério. Além disso, ele acaba se submetendo a condições degradantes, como a violação a normas de saúde e segurança do trabalho, a prática de jornadas exaustivas e, muitas vezes, a ameaças de punições cruéis e desumanas. Para combater essas situações, o trabalhador precisa procurar algum ramo do Poder Público que esteja apto a receber sua denúncia, seja o MPT diretamente, o Ministério do Trabalho, uma unidade da polícia, ou por intermédio de entidades da sociedade civil, como igrejas e organizações não governamentais.

Liliam Deisy Ghizoni: Um trabalhador em situação de escravidão é submetido à condição de exploração, sem a possibilidade de deixar o local de trabalho por causa das dívidas, podendo haver ameaças e violências físicas ou psicológicas. É um trabalhador que atua em expediente penoso que vai além de horas extras e coloca em risco a integridade dele, pois o intervalo entra as jornadas é insuficiente para a reposição das energias e o descanso semanal não é respeitado. Com isso, o sujeito também não consegue ter vida social e familiar. É um trabalhador que acaba sendo vítima de uma fabricação de dívidas ilegais, que envolvem gastos com transporte, alimentação, aluguel, ferramentas de trabalho, por exemplo. Os valores são descontados dos salários, mas o trabalhador sempre está devendo. Por fim, é um trabalhador que se sujeita a viver num alojamento precário, sem assistência médica, com péssima alimentação, com falta de saneamento básico e água potável, além dos maus tratos e violência. Sozinho dificilmente o trabalhador se liberta destas amarras. Daí a importância da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) ter orçamento para fazer seu trabalho dentro do Ministério do Trabalho. Deste órgão, os demais fazem a sua parte.

Vitor Barros: Muitas consequências envolvem sintomas de baixa autoestima, medo, desconfiança. Podem desencadear episódios depressivos, transtornos do estresse pós-traumático, além dos riscos físicos, químicos e biológicos a que são submetidos (haja vista a falta de comprometimento com os riscos do trabalho realizado). Sair dessa situação é muito difícil, pois há um forte sistema de aprisionamento (seja pela ameaça verbal, à família do trabalhador ou pela contratação de vigilantes armados). Por isso que, na maioria dos casos, se fala em resgate de trabalhadores em situação análoga à escravidão.



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