No Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, o CRP 01/DF, por meio de sua comissão especial LGBT, destaca a fragilização da saúde mental da população LGBT em decorrência das violências sofridas nas mais diversas esferas sociais
Por Felipe de Baére*
Publicado em 10/09/2017
No Setembro Amarelo, campanha que visa intensificar ações de prevenção do suicídio ao longo do mês, ampliamos nossos canais de comunicação para dialogarmos com maior periodicidade sobre esse crescente fenômeno social. A intenção é a desmistificação de crenças equivocadas sobre o comportamento suicida, a supressão de tabus, a fim de que mais pessoas possam encontrar espaços para falar sobre seus sofrimentos, emoções pungentes que não costumam encontrar ambientes de acolhimento, sobretudo quando envolve o desejo de interromper afetos intoleráveis com o fim da própria vida.
O suicídio trata-se de um fenômeno complexo, multideterminado. Por mais que seja recorrente a leiga atribuição de um único fator precipitante para justificação do ato, é preciso compreender que a vulnerabilidade para o suicídio se constitui em um conjunto de elementos precedentes. Além disso, embora seja necessário levarmos em consideração as singularidades das trajetórias ao pensarmos nos motivos para a manifestação do comportamento suicida, há grupos cujos privilégios sociais lhes garantem cenários de subjetivação mais harmoniosos, com maior possibilidade de articulação de redes de apoio e de preservação psíquica.
Quando uma pessoa não se enquadra nos padrões normativos, maiores são as chances de ela sofrer retaliações cotidianas, opressões regulatórias que visam a correção do que é considerado “desvio”. Nesse sentido, é preciso atentarmos para a fragilização da saúde mental da população LGBT em decorrência das violências sofridas nas mais diversas esferas sociais. Embora ainda seja reduzido o número de trabalhos que envolve o comportamento suicida da população LGBT no cenário nacional, a literatura estrangeira aponta para a aumento daprobabilidade do suicídio entre essa população, tendo em vista as suas especificidades.
A ausência de apoio social e institucional; agressões vividas desde a infância nos espaços de socialização, que não são compartilhadas dentro de casa devido ao receio de serem recebidas com mais hostilidades; isolamento social e permanente sensação de desamparo; impossibilidade de expressão afetiva e identitária; sensação de inadequação com a própria existência;desconforto e indignação quando a identidade de gênero ainda é considerada uma doença em variados ambientes da comunidade acadêmica e científica. Quantos são os desafios que uma existência é capaz de suportar cotidianamente em uma sociedade heterocisnormativa?
Nós também precisamos falar sobre o suicídio em uma dimensão social, na qual determinadas existências são precarizadas devido ao preconceito e às discriminações diárias. Dentro de um contexto atravessado pela lesbofobia, gayfobia, bifobia, transfobia, travestifobia, há pessoas que perdem o direito à vida muito antes de cometerem o suicídio. O elevado número de casos de autoextermínio da população LGBT precisa ser mais debatido, para que multipliquemos as ofertas de apoio e de acolhimento, o que inclui a abertura para os debates sobre gênero e diversidade sexual nos ambientes de ensino, com o intuito de suprimir o bullying LGBTfóbico; os projetos de moradia para os jovens LGBTs expulsos de casa por suas famílias; o fortalecimento da empregabilidade, com mais possibilidades de qualificação profissional; a ampliação de serviços de acompanhamento psicossocial especializados nas demandas da população LGBT. Fortalecemos as redes de proteção para que menos vidas sejam perdidas.
Caso esteja passando por um momento difícil, procure um profissional especializado e/ou entre em contato com o Centro de Valorização da Vida, pelo telefone 141 ou pela página www.cvv.org.br
* Felipe de Baére é psicólogo clínico, membro da Comissão Especial LGBT do Conselho Regional de Psicologia do Distrito Federal (CRP 01/DF) e mestrando no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica e Cultura na Universidade de Brasília (PPG-PsiCC).