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ENTREVISTA COM A NOVA DIRETORIA NACIONAL DA SBPO

ENTREVISTA COM A NOVA DIRETORIA NACIONAL DA SBPO



Psicólogas falam sobre o contexto nacional da Psico-Oncologia e sobre o papel dos profissionais na promoção de saúde

Neste Outubro Rosa, o Conselho Regional de Psicologia do Distrito Federal (CRP DF) traz uma entrevista com membros da recém-empossada diretoria nacional da Sociedade Brasileira de Psico-Oncologia (SBPO). Até 2018, a diretoria contará com 4 membros de Brasília. A presidente, Juciléia Rezende Souza, e a segunda-secretária, Silvia Maria Gonçalves Coutinho, falam sobre o trabalho desenvolvido por profissionais de Psicologia na área da Oncologia e sobre o cenário brasileiro em promoção de saúde.

O que é a Sociedade Brasileira de Psico-Oncologia?

Juciléia: A Sociedade Brasileira de Psico-Oncologia foi instituída em 1994 e, de lá para cá, seu objetivo primordial tem sido difundir a área, agregar os profissionais de Psico-Oncologia e possibilitar sua formação e direcionamento, visto que a atuação do psicólogo dentro da Oncologia é diferenciada, tem várias necessidades que precisam ser supridas e a SBPO tem o intuito de criar orientações para a formação desses profissionais.

Silvia: A Psico-Oncologia é uma área multidisciplinar de nascença, o que já podemos perceber pelo nome, que representa uma interface entre a Psicologia e a Oncologia. A perspectiva da Psicologia da saúde é algo que tem crescido muito ultimamente, tem contratado muitos profissionais, mas ainda é uma área em formação do ponto de vista acadêmico. Muitas pessoas ainda não têm a formação específica que é necessária para trabalhar nessa área. Temos muitas pessoas trabalhando na Psicologia da saúde ou na Psico-Oncologia sem essa formação e a SBPO traz uma possibilidade de ajudar também nesse aspecto, por meio de cursos, congressos e divulgação da área, que tem modelos teóricos e trabalhos muito específicos.

Juciléia: No Brasil já temos muita produção científica nessa área que não é compilada para chegar ao conhecimento público. Não temos uma revista científica de Psico-Oncologia ainda, por exemplo, que é algo que esperamos fazer acontecer. Um de nossos objetivos é tentar saber o que é feito nas várias unidades hospitalares, o que é e o que não é publicado, quais as características dos profissionais. Fora do Brasil, a Psico-Oncologia é bastante difundida e agrega vários profissionais, com produções sobre prevenção, promoção de saúde, reabilitação de pacientes e todo um arcabouço teórico construído que precisa ser utilizado por nossos profissionais.

Além da formação, quais os atuais desafios da Psico-Oncologia no Brasil?

Silvia: Uma das questões que mais me chama a atenção e que possivelmente trouxe a diretoria nacional da SBPO para o centro-oeste é a falta de conhecimento do que se faz em cada região do País. Como na área da saúde de um modo geral, na Psico-Oncologia costumamos conhecer muito mais o que é feito no eixo Rio-São Paulo ou Sudeste e Sul do Brasil. Existem muitos serviços bons sendo oferecidos aqui em Brasília, no Mato Grosso, em Goiás, no Nordeste e no Norte também e que não são conhecidos por estarem mais distantes desse eixo e cujos profissionais muitas vezes não podem se deslocar para o Sul e Sudeste, tornando a comunicação mais difícil. É um desafiopara esta gestão da SBPO poder divulgar a Psico-Oncologia e interagir mais com as regionais para saber o que é feito. Se por um lado existe um modelo, existem também diferenças nas formas de atuação, nos instrumentos utilizados, no tipo de proposta feita. Se conseguirmos integrar isso, só temos a crescer e melhorar. É um desafio da SBPO dar suporte para quem quer fazer Psico-Oncologia e se sente sozinho, poder saber como se faz, por exemplo, em Brasília ou no Nordeste, até porque temos características culturais muito específicas também.

Juciléia: Outro grande desafio  tem a ver com as legislações. Hoje em dia temos legislações próprias que fazem com que o psicólogo seja obrigatório nas unidades de Oncologia. Entretanto, não há uma regulamentação de como deve ser essa obrigatoriedade. Muitas vezes, contratam um psicólogo para atender um número excessivo de pacientes porque não tem uma orientação sobre o quantitativo de pacientes por profissional, o que, muito provavelmente, teremos que trabalhar junto com os conselhos profissionais no sentido de verificar as condições que esse psicólogo tem para trabalhar. Outro grande desafio é o grande número de abordagens teóricas brigando por espaço e por posse de determinado saber. No nosso último congresso, inclusive, realizamos uma mesa multidisciplinar dentro da própria Psicologia e participaram em conjunto diferentes abordagens: análise do comportamento, sistêmica, abordagem ericksoniana, transpessoal. É possível ter linhas guias de atendimento em diferentes abordagens sem que elas precisem brigar por espaço. A ideia também é agregar as diferentes abordagens para que elas possam se ajudar.

Vocês observam avanços nos últimos anos dentro da Psico-Oncologia?

Juciléia: Ao mesmo tempo em que ainda é um desafio, a legislação é também um grande avanço. Você conseguir que, por lei, o serviço de Oncologia só exista se ele tiver um psicólogo, é uma mudança de concepção. Outro avanço que a gente percebe é o aumento no número de residência de psicólogos em Oncologia. No Hospital Universitário de Brasília (HUB), coordeno o Programa de Residência multiprofissional com ênfase em oncologia, no qual estão os psicólogos que vão sair habilitados em Oncologia. Esse aporte do governo e esse reconhecimento de que a presença do psicólogo é importante são avanços enormes.

Silvia: Eu comecei a me envolver com essa área ainda na época da faculdade, em 1992, quando ainda nem existia a SBPO e, de lá para cá, a gente vê um número muito grande de estudos, principalmente em Mestrado e Doutorado, nessa área, e vemos que as pessoas estão tendo um interesse maior e os demais profissionais de saúde não têm mais um estranhamento sobre a atuação do psicólogo na Oncologia. Na faculdade onde trabalho já ouço da coordenação que a área de saúde é um dos lugares para onde mais vão os psicólogos recém-formados e por isso está havendo uma ampliação do número de disciplinas no currículo. Os alunos cobram.

Juciléia: Acho que a legislação é uma resposta de tudo isso que a Silvia falou porque ela não foi uma luta do psicólogo, mas uma exigência das equipes que entenderam que não conseguem atender a complexidade que o paciente apresenta sem a presença de um profissional de Psicologia. O aumento no número de eventos de Psico-Oncologia e de produção na área são outros avanços que também destaco no Brasil e no mundo. Outro marco é que já começamos a ver as produções científicas do Brasil serem publicadas internacionalmente. Vários profissionais brasileiros já publicam nas revistas científicas internacionais e são convidados para eventos científicos para falar do que está sendo produzido aqui.

O Distrito Federal tem quatro representantes nesta nova diretoria nacional da SBPO que assume a gestão até 2018. Como é foi o processo de escolha e o que significa essa representação?

Juciléia: Além das quatro pessoas de Brasília, temos ainda duas pessoas de Pernambuco e uma de São Paulo, que era de Brasília até dois anos atrás, totalizando sete membros na direção nacional. Recebemos um convite da gestão anterior e, durante o Congresso, em Assembleia Geral, fomos eleitos por unanimidade. Creio que isso represente todo esforço que é feito há anos. A Silvia, por exemplo, trabalha na Psico-Oncologia Pediátrica e é reconhecida em todo o Brasil há muitos anos. A Giselle também tem um trabalho bastante reconhecido em cuidados paliativos, assim como minhas atividades e pesquisas no HUB estão se tornando conhecidas fora de Brasília. Acho que isso é um reconhecimento de que temos know-how no centro-oeste, de que coisas acontecem aqui e que podem ser compartilhadas com o restante do País. Outro ponto é que é um grupo jovem e todo mundo está envolvido com produção científica, podendo contribuir para agregar ainda mais a teoria à prática diária do psico-oncologista.

Para concluir, temos um assunto importante que não podemos deixar de tratar: o Outubro Rosa. O que a Psicologia traz de reflexão nesta data sobre o câncer de mama?

Juciléia: Acho que a primeira coisa que precisamos lembrar é o que significa o Outubro Rosa, porque não é uma comemoração, mas um mês de luta. O objetivo é fazer com que as pessoas possam lembrar que existe o câncer de mama, que o tratamento no Brasil não é tão efetivo quanto deveria ser, lembrar aos gestores que precisamos de maior investimento nessa área e que esse é um dos tipos de câncer mais incidentes no mundo. Infelizmente no Brasil o diagnóstico precoce é muito raro. Ele acaba sendo para pessoas que têm uma condição financeira mais confortável e acesso a planos de saúde. Mesmo quando temos o diagnóstico precoce no sistema público, a demora até o atendimento deixa o tratamento mais difícil. Essa é a grande luta nesse mês. No contexto do câncer de mama, o papel do psico-oncologista é trabalhar para a educação e empoderamento das pessoas e fazer com que possam lutar pelos seus direitos. O psico-oncologista pode estar no momento da prevenção, atuando com educação em saúde, promovendo mudança de hábitos, e favorecendo que a melhoria da percepção da pessoa sobre o seu próprio corpo e o tipo de cuidado que ela precisa exercer. Atua-se também nos níveis secundários e terciários para ajudar no diagnóstico precoce, ou seja, trabalhar com a educação de novo para que a pessoa faça seu auto-exame e, mais do que isso, que ela faça os exames com uma equipe de saúde, e não deixe de ir ao médico, dado que o auto-exame já não é mais o diagnóstico precoce. Outra possibilidade é transmitir informações nos colégios, centros de saúde e comunidade para que compreendam melhor o contexto de diagnóstico e tratamento do câncer de mama e seu impacto psicossocial. Depois do diagnóstico, precisa-se trabalhar o impacto do adoecimento no indivíduo e sua rede de suporte social. Nós temos alguns objetivos como: fazer com que as pessoas tenham menos medo do câncer de mama e consigam enfrentar melhor a doença e os tratamentos. No final do tratamento oncológico, se a pessoa chega à cura, ela ainda precisará retornar à rotina e se reabilitar, podendo precisar continuar sendo acompanhada pelo psico-oncologista. Quando a cura não é possível, trabalha-se dentro da perspectiva dos cuidados paliativos para que consiga se comunicar melhor com seus familiares, possibilitando despedidas, como também para que consiga lidar melhor com as mudanças corporais e limitações cada vez mais difíceis de serem toleradas,e principalmente para que lidem com a possibilidade de morte. Um psicólogo que atua em oncologia deve estar presente desde o início, antes mesmo do diagnóstico, atuando na prevenção, e participando do acompanhamento até seu desfecho. Quando a cura é possível, a reabilitação psicossocial é necessária. Quando a cura não é possível, o suporte ao paciente e familiares é imprescindível, e deve continuar a ser oferecido aos familiares mesmo após o óbito do seu ente querido.

Silvia: Reforço também essa questão da conscientização, porque é importante entender por que a campanha existe. Normalmente quando pensamos em Outubro Rosa, as pessoas relacionam mais à prevenção. A gente vê até lojas femininas e restaurantes que fazem promoção em alusão à data. Isso pode ajudar na auto-estima das mulheres? Pode, mas a grande questão é melhorar o índice de cura e favorecer o tratamento adequado, a gente precisa é de conscientização. Um dado por exemplo ao qual as pessoas não prestam muita atenção é que o governo faz uma campanha preventiva para o diagnóstico precoce, mas os hospitais dão acesso aos exames de mamografia? Muitas vezes os hospitais públicos não têm uma quantidade suficiente de mamógrafos para a mulher fazer o exame e, logo, ela não consegue o diagnóstico precoce, mesmo que ela tenha o comportamento preventivo. Se ela começa o tratamento rápido, o hospital tem os quimioterápicos que ela precisa? Vemos aqui em Brasília o que é um problema nacional: a falta de medicação. Outro dia estava ajudando o pai de um ex-aluno meu que está em um quadro que pode evoluir para uma leucemia e não existe a medicação que ele precisa, tem que entrar na justiça, demora meses para conseguir o medicamento e, nisso, a doença já avançou. É a isso também que precisamos estar atentos para pensarmos o que nós psicólogos podemos fazer nesse aspecto de educação e de postura política de conscientizar a sociedade e a própria categoria profissional.



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