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CRP 01/DF ENTREVISTA COM A PSICÓLOGA FABIANA ANGÉLICA COSTA

CRP 01/DF ENTREVISTA COM A PSICÓLOGA FABIANA ANGÉLICA COSTA



Estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1987, o Dia Internacional da Luta contra o Abuso e o Tráfico Ilícito de Drogas chama a atenção da população mundial para a necessidade de planejamento de ações para enfrentamento da dependência química e combate ao tráfico de drogas. Para compartilhar suas experiências na área, convidamos para uma entrevista a psicóloga e coordenadora do Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPS-AD) III de Ceilândia, Fabiana Angélica Costa. Formada psicóloga pela Universidade Federal de Uberlândia, Fabiana tem experiência de atuação como terapeuta comunitária, especialização em Saúde Mental no Trabalho e formação em Gestão do Sistema Único de Saúde (SUS), tendo como linhas de pesquisa Saúde Mental e Dependência Química. Confira:

Em que consiste o trabalho desenvolvido pelo psicólogo em um Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas (CAPS-AD)?

O trabalho desenvolvido aqui no CAPS AD III de Ceilândia é um trabalho essencialmente em equipe. É um trabalho biopsicossocial, no qual o psicólogo atua ao lado do médico, do assistente social, do terapeuta ocupacional, do farmacêutico, do enfermeiro e do técnico de enfermagem. Na dependência química é muito importante que o paciente e a sua família tenham essa noção desse trabalho em equipe porque a dependência química é multifacetada. Você atua com o dependente químico e também com o familiar, com o contexto no qual aquele dependente está inserido e essa multiplicidade de olhares é favorável para que a gente consiga obter melhores resultados no tratamento.

Especialistas no tratamento da dependência em álcool e outras drogas têm destacado que um dos desafios atualmente postos é fazer com que o conhecimento sobre a estrutura do Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas – SISNAD, definido no Decreto nº 5.912/2006, chegue à população brasileira. Qual a importância de difundir essas informações?

A gente percebe que a grande maioria das pessoas não sabe o que é um CAPS. Em relação à dependência química, há um mito de que o tratamento só ocorre através da internação. É comprovado que o tratamento em dependência química é um tratamento a longo prazo. Ninguém começa a usar substâncias psicoativas do nada, tem um motivo para isso. A droga tem um lugar na vida daquele sujeito, daquela família, daquela comunidade. Então o Centro de Atenção Psicossocial trabalha nessa abordagem, se o sujeito assim quiser, porque em primeiro lugar a gente trabalha com o desejo do sujeito, a não ser que ele não esteja respondendo por ele. Mas a grande maioria dos nossos pacientes responde por eles sim. Então a gente vai respeitar o desejo dele. A gente trabalha aqui com melhoria da qualidade de vida. A questão da cura em dependência química é uma questão muito contraditória. Nós não trabalhamos com a intenção da cura, mas sim da melhoria qualidade de vida do paciente. O que aquele paciente está preparado para aquele momento. Não apenas ele, mas o familiar também. Quando procura o tratamento, a grande maioria dos familiares busca por internação, o que a gente entende, uma vez que a família está muito sofrida, é muito desgastante, mas essa família também precisa ser trabalhada e por isso esse olhar múltiplo, de uma equipe multiprofissional, em um regime de tratamento aberto. No nosso caso, somos um CAPS III. Então nós temos aqui a internação breve, por até 15 dias. O principal critério dessa internação é muitas vezes a desintoxicação. Então nós temos um critério físico, mas findado esse tempo o paciente retorna ao seu tratamento e o plano individual de tratamento do paciente é semanal. Então, por exemplo, ele pode estar em um tratamento intensivo, semi-intensivo ou não intensivo de acordo com quantidade de atividades terapêuticas que ele frequenta no CAPS. E a família precisa ser inserida. A família precisa ter esse tratamento também à disposição. Ela precisa entender qual o papel dela no tratamento da dependência química. É um tratamento a longo prazo, a gente precisa muito estar na comunidade, a atuação na comunidade é muito importante. Aqui nós promovemos vários eventos com o intuito de sensibilizar a comunidade para que ela entenda qual o papel do CAPS, qual o papel dela também quebrando mitos como aquele de que o dependente químico é uma pessoa violenta ou uma pessoa desprovida de caráter e que ela para quando ela quiser.

A luta contra o abuso e o tráfico Ilícito de drogas envolve a articulação entre diferentes políticas de Estado. Como você avalia hoje esse cenário no Distrito Federal?

Eu acho que a dependência química é tratada muito como caso de polícia e não como caso de saúde. Acho que a comunidade e todos nós deveríamos entender que a dependência química é uma questão de saúde, é uma questão social e, em alguns casos, é uma questão de justiça também. As questões sociais também contribuem, elas também devem ser levadas em consideração. Nós não podemos ser taxativos. Assim como o trabalho deve ser multiprofissional, esse entendimento sobre o uso e o abuso das substâncias psicoativas deve ser multi também. Dependência química é um caso de saúde sim, é uma doença crônica, grave, que afeta o indivíduo, a sua família, a sua comunidade. Enquanto nos fixarmos em questões imediatistas vai ser difícil mudar o nosso cenário.

Os equipamentos públicos disponíveis atualmente na região dão conta da demanda do tratamento da dependência em álcool e outras drogas? Como podemos avançar?

Ceilândia é a maior região administrativa do DF, tem o maior contingente populacional. O nosso CAPS aqui funciona de portas abertas. No dia que o paciente chega, ele já é acolhido e avaliado. Não há fila de espera. O usuário chega e é atendido no mesmo dia. Para iniciar o tratamento, levamos em conta critérios de perfis: maior de 16 anos de idade, residente em Ceilândia e com a situação de uso ou abuso de substâncias psicoativas. Mas é claro que nós precisamos de mais apoio, principalmente o apoio da rede social. Então aquele paciente que está em situação de rua, a gente faz a internação dele por até 15 dias, mas precisamos ampliar nossa rede social de abrigamentos e instituições porque não temos aqui as residências terapêuticas. Então a gente tem que lutar para conseguir esses equipamentos. A residência terapêutica é algo muito importante na atenção em saúde mental. A gente trabalha muito em rede, tem o CREAS, tem o CAPS, tem o Conselho Tutelar. Então a gente faz essa parceria também com as instituições intra e intersetoriais.

Datas como o Dia Internacional contra o Abuso e o Tráfico Ilícito de Drogas nos levam a refletir sobre as ações públicas no que se refere à prevenção de questões que culminam em problemas sociais, como a dependência química e o tráfico de drogas. Como você avalia essas ações hoje no país e, principalmente, no Distrito Federal? Podemos fazer mais?

Nós podemos fazer mais se nós tivermos o entendimento do conceito de saúde que está preconizado no SUS. Melhoria de qualidade de vida, mais acesso a lazer, a cultura. Tudo isso é promoção de saúde. Quanto mais nós levarmos a sério o conceito lindo que temos no SUS sobre saúde, o que é ter saúde, que não é somente a ausência da doença, saúde é muito mais que isso, é ter acesso às políticas públicas. O nosso país precisa muito crescer em relação a isso e eu sou muito otimista. Aqui em Ceilândia contamos muito com a rede e trabalhamos dentro dessa perspectiva de o usuário chegar aqui e ele ter acesso ao Centro Olímpico para ele fazer a natação, quando ele não tem renda para pagar uma aula de natação. Ele ter acesso a esse equipamento, a essa atividade. A grande esperança é que todos nós tenhamos esse entendimento da saúde, da promoção da saúde, do que é promover a saúde. Não é apenas colocar mais profissionais na saúde, mas sim também termos equipamentos disponíveis para a população. Nem sempre é necessário, mas quando é, o acesso ao medicamento é muito importante, principalmente naqueles casos em que o paciente está em crise e precisa estabilizar. Para mim, a grande questão é levar a cabo o conceito de saúde, trabalhar os equipamentos sociais, ter esse olhar multifacetado, isso é muito importante.



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