O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) delibera, em seu artigo 4°, que “é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.”
Portanto, é fundamental que, compartilhando dos princípios de direitos humanos previstos no Código de Ética Profissional da Psicóloga (2005), profissionais da Psicologia que se comprometem com as infâncias e adolescências compreendam que seu trabalho deve ser sustentado em diretrizes voltadas para desenvolvimento e proteção integral das crianças e adolescentes.
Nesta quarta-feira, dia 13 de julho, o Estatuto da Criança e do Adolescente completa 32 anos. O aniversário da promulgação desse importante documento precisa ser celebrado, afinal ele é fruto de importantes lutas e mobilizações sociais, representando, desde a publicação, grandes avanços no campo dos direitos de crianças e adolescentes.
Paralelamente, observa-se, no cotidiano, que as conquistas sociais não estão dadas, mas em constante disputa e construção. Fatos recentes como o posicionamento coercitivo da justiça diante da demanda por um aborto legalizado para uma criança vítima de estupro e a mobilização parlamentar para aprovação do homeschooling são ilustrações concretas da forma como os direitos e garantias previstos no estatuto ainda passam por instabilidades institucionais.
Assim é que o atual cenário deste aniversário se mostra preocupante para meninas e meninos com menos de 18 anos, sujeitos de direitos que vivenciam o sucateamento de suas possibilidades de proteção e desenvolvimento integral em uma sociedade que, no ano de 2022, retorna ao mapa da fome após período de isolamento social em função da pandemia de Covid-19. Contexto este em que crianças e adolescentes, principalmente de classes populares mais desfavorecidas, tiveram muitas vezes violados seus direitos à alimentação, educação, esporte, lazer e convivência comunitária.
O aumento do desemprego, a diminuição do investimento e alcance das políticas públicas de assistência social, o afastamento das atividades presenciais nos espaços da escola e a proibição da realização de outras atividades sociais enfraqueceram as redes de apoio, cuidado e proteção destes meninos e meninas que necessitam de serviços integrados para que as garantias previstas no ECA sejam, de fato, operacionalizadas.
Dados de instituições de pesquisa brasileiras revelam que 13% das crianças deixaram de comer por não irem à escola (USP, 2022); mais de quatro milhões de estudantes iniciaram a pandemia sem acesso a internet, sendo mais de 90% estudantes de escolas públicas (IBGE); os órgãos de justiça evidenciaram a subnotificação da violência contra crianças e adolescentes quando estes deixaram de frequentar a escola e outros espaços sociais, durante o período de isolamento social; a insegurança alimentar atinge mais de 33 milhões de famílias brasileiras e a fome dobrou nas famílias com crianças menores de 10 anos, segundo o mapa da fome; o retorno às atividades presenciais nas escolas do Distrito Federal têm sido marcado por inúmeras dificuldades pedagógicas e relacionais, além dos altos índices de violência em escolas.
Destacamos aqui a importância da política educacional, em especial do espaço escolar, como importante articulador da rede de atenção e proteção integral às crianças e adolescentes, diante da significativa conquista social que é a democratização da educação.
Neste espaço institucional, psicólogas/os escolares podem exercer o papel de articuladores que favorecem a efetivação dos direitos previstos pelo ECA, bem como podem atuar para a construção de uma cultura que vá ao encontro das necessidades desenvolvimentais das infâncias e adolescências contemporâneas.
E, para além do espaço da escola, os profissionais da Psicologia precisam representar o acolhimento a partir de uma escuta sensível e respeitosa de todas as possibilidades de ser das crianças e adolescentes e, também, representar a luta por uma sociedade mais justa e igualitária, na qual estes sujeitos possam ter uma vida digna e acreditarem em seus sonhos por se sentirem seguras e seguros diante da garantia de seus direitos fundamentais.
Assim, coloca-se em evidência a necessidade da Psicologia, enquanto ciência e profissão, participar da defesa dos Direitos Humanos e do ECA na luta pela garantia do desenvolvimento e proteção integral de crianças e adolescentes.
É imprescindível a presença de psicólogas/os comprometidas/os, ética e socialmente nas políticas públicas, especialmente nas políticas sociais como educação, saúde, assistência social, segurança pública e justiça. E, mais ainda, faz-se urgente a construção e consolidação de diretrizes para uma atuação articulada intersetorialmente, que seja capaz de acolher e atender as diversas infâncias e adolescências, tanto no serviço público como na iniciativa privada.
*Esta nota é assinada pelas coordenadoras da Comissão Especial de Psicologia e Educação do CRP 01/DF. Michelle de Faria Nunes (CRP 01/16011) é psicóloga escolar na Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEEDF) e mestra em Psicologia do Desenvolvimento e Escolar; Carolina Bauchspiess (CRP 01/19629) é também psicóloga na SEEDF e mestra em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde.
#DescreviParaVocê: o card colorido apresenta uma foto de crianças em um ambiente escolar. Consta o conteúdo textual: 13 de julho, 32 anos do ECA. Confira a nota da Comissão Especial de Psicologia e Educação. Entre aspas: Coloca-se em evidência a necessidade da Psicologia, enquanto ciência e profissão, participar da defesa dos Direitos Humanos e do ECA na luta pela garantia do desenvolvimento e proteção integral de crianças e adolescentes. No canto direito inferior, com aplicação na cor branca, está a marca gráfica do CRP 01/DF.