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CRP 01/DF ENTREVISTA: NO DIA INTERNACIONAL DA MULHER NEGRA LATINO-AMERICANA E CARIBENHA, O CRP 01/DF COMPARTILHA ENTREVISTA CONCEDIDA PELA PSICÓLOGA JOYCE AVELAR

CRP 01/DF ENTREVISTA: NO DIA INTERNACIONAL DA MULHER NEGRA LATINO-AMERICANA E CARIBENHA, O CRP 01/DF COMPARTILHA ENTREVISTA CONCEDIDA PELA PSICÓLOGA JOYCE AVELAR


Neste 25 de julho é celebrado o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-americana e Caribenha, data instituída em 1992 a partir do 1º Encontro de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas, ocorrido em Santo Domingo, na República Dominicana, com o intuito de denunciar diferentes formas de opressão e debater possibilidades de apoio à luta de mulheres contra o racismo, o sexismo e o classismo no mundo.

Atento às implicações éticas da temática, o Conselho Regional de Psicologia do Distrito Federal (CRP 01/DF) convidou a psicóloga Joyce Avelar (CRP 01/22564) para compartilhar reflexões advindas de suas vivências profissionais e acadêmicas a respeito dos processos subjetivos de populações vulnerabilizadas por diversos aspectos sociais, como ocorre com as mulheres negras no Brasil.

Mestre em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília (UnB), integrante da Articulação Nacional de Psicólogas(os) Negras(os) e Pesquisadoras(es) (Anpsinep), Joyce atua como psicóloga clínica em abordagem psicanalítica e acredita em uma prática crítica que incorpora a interseccionalidade de raça, classe, gênero e sexualidade. Confira a entrevista a seguir:

Em que linhas se concentram seus estudos e a sua atuação na Psicologia, e o que a tem motivado por esse caminho?

Sou psicóloga clínica e sempre foquei meus estudos e minha prática profissional na análise dos processos subjetivos de populações vulnerabilizadas pelas condições de raça, classe, sexualidade e gênero. Escolher esse caminho diz sobre os meus próprios pertencimentos, processos de enraizamento, perspectiva ético-política e desejo de transformação das realidades que nos oprimem.

No âmbito do consultório, os marcadores de interseccionalidade que envolvem gênero, raça e classe são muito presentes entre as clientes/pacientes que procuram o seu atendimento? De que forma eles costumam aparecer nos relatos trazidos por mulheres negras?

Nossos pertencimentos sociais nos constituem. As questões de raça, classe, gênero e sexualidade estão sempre presentes nas relações sociais, nos nossos modos de pensar, ver, sentir, ter experiências de prazer ou sofrimento. Na escuta clínica, a complexidade desses entrelaçamentos e como tomam forma em cada singularidade, exige, antes de tudo, permitir e reconhecer essa existência. Pode parecer algo simples, mas há uma pressão neoliberal de individualizar cada vez mais o sofrimento, buscando tirar de cena os fatores sociais que o atravessam e o estruturam.

Poder escutar como o racismo, a misoginia, a falta de recursos materiais e simbólicos são opressões que machucam, que doem e afetam, é quebrar e romper com um histórico e com os projetos políticos de silenciamento, de apagamento da história e da subjetividade das populações vulnerabilizadas.

Nos relatos clínicos de mulheres negras, é perceptível como o racismo e a misoginia, em diferentes medidas, tendem a afetar negativamente a autopercepção, a autoestima, os projetos de vida e de futuro, e podem impactar nas relações de trabalho, parentais e amorosas. Mas é importante frisar que, diante das múltiplas formas como as opressões se entremeiam, se presentificam no cotidiano e se grudam nas nossas subjetividades, torna-se imprudente as generalizações, porque a opressão não é estática, ela se adapta, se agarra, encontra suas próprias formas de nos violar. Em contrapartida, nós encontramos as nossas próprias formas de resistir, de escapar, de aquilombar, de dar conta, de não dar conta, de sofrer, de sorrir, de chorar, de desejar... enfim, de seguir existindo.

Na sua avaliação, o que ainda falta para que as mulheres negras ocupem um lugar de maior visibilidade na sociedade brasileira?

Essa pergunta é difícil, porque são muitas as faltas. Primeiro, acho que precisamos "desconfundir" o que significa estar visível e o que temos chamado de representatividade. Há, nas teias do capitalismo, uma falsa inclusão, uma falsa participação e uma falsa mudança. Mais do que aparecer nas telas, nas mídias ou ocupar assentos (muitas vezes figurativos) nos espaços políticos, precisamos estar no centro das decisões.

Há muito, muito sendo feito pela população negra, dentro e fora dos movimentos sociais, mas os espaços de poder de transformação das estruturas sociais, seguem fechados para nós. A nossa participação precisa ser expressiva nos centros do poder, sejam governamentais, jurídicos, midiáticos, educacionais, empresariais e comunitários. Não acredito que nenhuma dessas transformações sejam possíveis, sem um profundo processo de conscientização política de raça e classe.

Junto a isso, é preciso novas formas de produção e redistribuição das riquezas e recursos materiais. Quem é que luta com fome, sem segurança, sem lazer, sem descanso e sem saúde mental? Para avançar na justiça social, ainda precisamos (re)construir e fortalecer o básico da produção de recursos simbólicos e materiais.

Historicamente, nem sempre a Psicologia teve a postura crítica que adota atualmente em relação a questões como garantia de direitos, luta contra diferentes formas de opressão, dentre elas o racismo e a misoginia. Como você enxerga esse histórico e como avalia o papel da Psicologia hoje na luta antirracista?

A Psicologia, assim como inúmeras áreas do conhecimento, segue disputando os projetos éticos e políticos que orientam suas práticas e teorias. Estamos e seguimos em luta com a lógica dominante do capitalismo, neoliberalismo e da branquitude no interior da própria Psicologia. Então, ainda que tenhamos avanços no debate sobre direitos humanos e garantia de direitos, pensar no racismo, misoginia, LGBTQIAP+fobia e classismo, não deve se restringir ao âmbito das ideias e discussões teóricas, é na práxis que construímos as mudanças. A Psicologia precisa deixar-se transformar e integrar em suas bases a população periférica, negra e LGBTQIAP+. Sem a massiva presença física e epistêmica dessas pessoas nos espaços de poder, de escolha e decisão política, não consigo acreditar na mudança.

#DescreviParaVocê: card colorido no qual aparece uma foto da psicóloga Joyce Avelar e uma chamada textual para leitura da entrevista. Além de uma pequena ilustração de um microfone, aparece a marca gráfica do CRP 01/DF e um destaque para ler o texto associado à imagem.



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