Por Beatriz Neves*
O dia 25 de novembro, Dia Laranja, foi adotado pela Organização das Nações Unidas (ONU), desde 1999, como o Dia Internacional Pela Eliminação da Violência contra a Mulher. A escolha da data é uma homenagem às irmãs, Patria, María Teresa e Minerva Marival, que foram torturadas e assassinadas, em 1960, a mando do ditador da República Dominicana Rafael Trujillo; e também é um lembrete para a importância de se pensar em estratégias e articulações para o enfrentamento à violência que ainda acomete cotidianamente mulheres e meninas em todo o mundo, simplesmente pelo fato de serem mulheres.
A violência contra a mulher, conforme definido na Convenção do Pará, em 1994, trata-se de qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada. Essa violência acontece devido a um processo histórico de construção da sociedade no qual predominou visões patriarcais, machistas e misóginas em relação ao papel da mulher, o que contribuiu para o desenvolvimento de uma relação assimétrica de poder entre os gêneros, que colocava a mulher em um papel de submissão, passividade e até mesmo propriedade.
Muitas vezes, quando se fala em violência contra a mulher, lembra-se das violências cometidas no âmbito doméstico ou de relações íntimas de afeto, uma vez que essas acontecem com muita frequência e ganharam uma importante aliada para o seu enfrentamento, com a promulgação da Lei Maria da Penha, em 2006. Porém, não se pode esquecer da importância de se combater também outras violências ainda muito presentes na nossa sociedade, quais são: assédio, tráfico e exploração sexual, violência institucional, violência obstétrica, violências relacionadas à orientação sexual e/ou identidade de gênero, dentre outras.
Ao se pensar em como as psicólogas podem contribuir para a eliminação dessas violências é essencial observar, antes de tudo, a importância de uma atuação conjunta e em rede, uma vez que a violência contra as mulheres se trata de um problema complexo e multicausal, que envolve questões relacionadas ao contexto local e mais amplo no qual estas estão inseridas, e também aspectos transgeracionais. Além disso, é importante considerar as interseccionalidades que atravessam cada situação de violência, uma vez que fatores, como raça, classe, gênero, nacionalidade, idade, identidade de gênero, orientação sexual, deficiência, etc., são determinantes para a forma como as violências acontecem.
Essa atuação pode acontecer em duas frentes, tanto da prevenção como da intervenção e, em ambas, é importante que homens e meninos também sejam incluídos como público-alvo, uma vez que também estão inseridos no contexto de desigualdade de gênero que ainda prevalece na sociedade.
Quando se pensa em estratégias para se romper o ciclo de violência é possível propor a construção de planos de enfrentamento e segurança, de forma conjunta com essa mulher. Porém, não pode esquecer-se de também trabalhar ferramentas que possam estimular o seu desenvolvimento, seja por meio de orientações sobre direitos, possibilidades de inserção na educação e mercado de trabalho, autocuidado, autoestima e autonomia, a fim de que essa mulher alcance a sua emancipação.
Os desafios para a eliminação da violência contra as mulheres ainda são imensos, e a profissional da Psicologia vai se deparar com tais desafios no decorrer da sua prática, seja quando uma mulher não consegue acessar direitos, efetivar uma denúncia ou quando observar problemas no trabalho em rede, por exemplo. Por isso, é importante que essa profissional desempenhe o seu trabalho a partir de uma prática reflexiva, através da qual possa auxiliar também a mulher a lidar com esses desafios presentes no cotidiano, por meio da oferta de uma escuta ativa, acolhedora e sem julgamentos.
*Beatriz Neves (CRP 01/20432) é psicóloga (UCB) e especialista em Saúde da Família e Comunidade (ESCS). Atualmente, é especialista em Desenvolvimento e Assistência Social, na Secretaria de Estado de Justiça e Cidadania do Distrito Federal, na qual atua no Direito Delas, programa que atende vítimas de violência.
#DescreviParaVocê: a imagem colorida conta com uma chamada para leitura do artigo, além da marca gráfica do CRP 01/DF e de uma fotografia da autora. Beatriz Neves é uma mulher negra, com cabelos cacheados e longos, está usando óculos e vestindo uma blusa preta.